Ao longo do tempo diferentes ferramentas surgiram para tornar o treinamento do ciclismo e Mountain Bike mais eficaz, objetivo e distante de erros de prescrição e análise. Dentro desse contexto, atualmente parece consenso que a ferramenta que mais auxilia ciclistas em seus treinamentos é o medidor de potência. Esse artigo trata de questões iniciais sobre esses equipamentos e as vantagens de se ter um deles instalado em sua bicicleta.
Conceito de Potência no Ciclismo
Medidor de potência ou power meter é uma ferramenta que tem como função principal medir a potência da pedalada do ciclista em sua própria bicicleta.
Modelos de Medidores de Potência
São inúmeras as marcas que produzem power meters, e diferentes também são os preços que eles chegam ao mercado. A marca de medidores de potência mais popular hoje é a CyclOps, com o PowerTap. Esses medidores são embutidos no cubo da roda traseira e têm precisão de aproximadamente 2% em sua medida quando comparados a aferições feitas em laboratórios. Os preços desses cubos variam de U$800.00 a U$1800.00 em seu país de origem, EUA. Na outra extremidade está o italiano MEP, vendido por 3.500 Euros. Esse power meter é muito interessante, pois além de analisar individualmente a potência gerada pelas pernas esquerda e direita, permite um ajuste de tamanho no braço do pedivelas. A maioria dos power meters são voltados às bicicletas de estrada, mas também há os desenvolvidos para o mountain bike, caso do SRM e PowerTap.
O mais tradicional e credibilizado entre todos os power meters é o SRM. De fabricação alemã, sua comercialização teve início no ano de 1986 e estende-se até hoje, fornecendo equipamento para as maiores marcas do mundo do ciclismo. O SRM funciona medindo a potência diretamente no pedivelas.
Medidores de potência disponíveis
- PowerTap – Uma das marcas mais tradicionais de medidores de potênica. Possui modelos de medidor de potência para o cubo traseiro e para pedais.
- Quarq – mede a potência de saída da pedalada no pedivelas, um dos sistemas mais precisos (e mais caros) do mercado.
- Vector – O potencimetro da Garmin. Mede a potência gerada nos pedais, possui modelos para medir potência em um ou dois pedais.
- MEP – mede individualmente a potência nas manivelas esquerda e direita do pedivelas; é o mais preciso de todos (0,25%)
- Ergomo – utiliza a torção de um dos lados do movimento central para medir a potência produzida
- Polar Look Keo Power – hoje há um projeto entre Polar e Look desenvolvendo um pedal que mede potência, mas há pouco tempo a Polar oferecia um power meter pouco convencional, o Electro o qual relacionava a a tensão e velocidade da corrente para determinar a potência gerada pelo ciclista
- PowerPod – mecanismo de cálculo indireto da potência através de equação matemática que relaciona as variáveis que atuam gerando resistência ao ciclista
- Smart trainers – Rolos de treinamento que possuem um medidor de potência instalado no sistema. Permitem não só treinar com potência, mas também realizar testes precisos e simular percursos com uma realidade impressionante.
O que é Potência?
Potência é uma taxa de trabalho ou transferência de energia dada em Watts. No ciclismo P = Fp * Vp, onde P é Potência, Fp é a Força aplicada ao pedal e Vp é a Velocidade angular do pedal. Pela fórmula conclui-se que tanto a alteração de Fp ou de Vp modificam o valor de P; em outras palavras, P é uma função da força e cadência.
Porque usar um medidor de potência
1. Objetividade
240W sempre serão 240W! A potência produzida e lida no ciclocomputador sempre será aquela que você realmente está produzindo, é sua capacidade de produzir trabalho. Independentemente da temperatura, humidade, hidratação, condições psicológicas entre outras variáveis, a potência produzida por você sempre mostrará com qual intensidade você está pedalando num determinado instante ou intervalo selecionado. Em contraponto à frequência cardíaca (FC) que responde lentamente ao esforço, a potência diz realmente desde o primeiro instante do intervalo em qual intensidade você está. Essa característica do treinamento com potência – além de outros aspectos mais específicos relacionados à fisiologia do exercício, lhe confere uma especificidade e exatidão muito maiores do que treinos prescritos baseados em frequência cardíaca.
2. Facilidade para realizar testes
Para se ter controle da evolução da performance e modular a carga de treinamento é necessário testar, testar e testar. Um medidor de potência é um laboratório portátil, visto que oferece possibilidade de testar as diferentes capacidades de um ciclista em sua própria bicicleta e assim renovar em certos períodos e com grande precisão o aspecto “intensidade” da carga de seus treinos. Normalmente o teste mais realizado entre os usuários de power meters é o FTP (Functional Threshold Power – Limiar Funcional de Potência). Esse teste oferece, através de cálculos percentuais, todas as faixas de potência em que um ciclista deve treinar para melhorar sua performance, desde a Recuperação Ativa até a Potência Neuromuscular.
3. Análise de treinos e provas
Ferramentas de Análises
Quando se pedala com um power meter, são gerados dados (potência, trabalho, distância, velocidade média, frequência cardíaca, entre outros) num arquivo. O medidor de potência pode vir com um software de análise desses arquivos incluso ou você pode utilizar um software livre para suas análises, tal como o Golden Cheetah e Garmin Center, ou um pago; o software pago que mais me agrada é o WKO+ do grupo Training Peaks, mas atualmente utilizo o Golden Cheetah, pois esse programa é fruto de um esforço contínuo e coletivo de um grupo de desenvolvedores-ciclistas.
Análises de treinos e competições
E para que analisar dados de treinos e competições? Uma das razões de se avaliar treinos constantemente é saber se o ciclista está trabalhando numa faixa adequada de treinamento. Allen e Coggan (2006) utilizam a medida Training Stress Score para avaliar o grau de fadiga gerado por um treino ou período de treinamento num ciclista. Sabendo dessa medida, pode-se deduzir quais são suas necessidades de descanso e substratos energéticos e também se pode ir ou não além do previsto na sua planificação.
Da mesma forma que é necessário preocupar-se com o excesso, também é importante avaliar os treinos para saber se o ciclista está atingindo suas metas durante as sessões. De nada adianta ter quatro intervalos de dez minutos a 300W se o ciclista não consegue passar cinco minutos nessa potência. Analisando gráficos é possível determinar de igual maneira se as expectativas de potência estão acima da realidade. E estando, uma reestruturação deve ser feita nos treinos.
De grande importância estratégica no momento de planejar e montar ciclos de treinamento é ter as referências de intensidade x tempo presentes nas competições focadas pelo ciclista. Competindo com um power meter é possível saber quais são os valores de potência produzidos dentro do pelotão, em subidas, fugas e outros momentos específicos. Com essa coleção de dados, o treinamento é planificado no intuito de atingir e ultrapassar as metas de potência geradas durante os eventos e atingir picos de performance em momentos pré-definidos na planificação do treinamento.
4. Identificar e superar fraquezas
Com um medidor de potência você consegue identificar objetivamente seus pontos fracos e assim trabalhar em cima deles para melhorar sua performance. Se você está sofrendo muito para acompanhar outros ciclistas em intervalos de um minuto, analise seus arquivos e saiba quanto está faltando de intensidade para chegar bem no final de sua competição meta.
5. Educar pedaladas
Tenho um amigo que chama os power meters de “instrumentos de tortura”. Ele diz isso porque nos treinos que segue determinada zona de potência o sofrimento percebido é atroz! Umas das razões disso é: quando se está treinando, encontram-se subidas, descidas e planos. Se você treina com medidor de potência, entende porque é praticamente uma martírio manter a potência num trecho de descida, mesmo que seja ameno o declive! Matematicamente isso acontece porque: P = Fp * Vp. Sendo assim, se Fp diminui, e é o que tende a ocorrer nas descidas por conta da dificuldade de recrutamento dos grupos musculares relacionados à pedalada, a potência vai diminuir também.
Portanto, para se manter em zonas de potência específicas em descidas, o ciclista precisará ter uma relação Fp * Vp constante, o que o obrigará a pedalar com consistência, sempre utilizando marchas para impor a Fp necessária à manutenção de sua cadência mais eficiente. Ter que manter a relação Fp * Vp constante torna a pedalada biomecanicamente otimizada, pois Fp – variável da equação mais relacionada ao recrutamento dos grupos musculares do movimento de pedalada – tem que se manter constante durante o aumento de velocidade e mudança de marchas inevitáveis durante descidas.
6. Melhorar aerodinâmica
Quando se pedala com um medidor de potência, pode-se ter uma grande noção de quanto a resistência do ar influencia na pedalada. Imagine-se pedalando numa reta a 40Km/h com um vento contra e você com o tórax perpendicular ao solo. Quando a intensidade das pedaladas é controlada por um power meter, é possível testar diferentes posições que geram menos resistência ao ar e saber realmente qual é a melhor posição. Sendo assim, quanto menor a resistência, menor será a potência gerada para a mesma velocidade ou maior será a velocidade para a mesma potência tendo em vista um vento constante.
Conclusão
Para mim foi um pouco complicado entender o quanto era importante o uso de um medidor de potência. E era assim tão complicado porque o princípio do treinamento com potência é extremamente simples: potência é o que de fato o ciclista busca, e é isso que ele tem que aumentar. Se a frequência cardíaca vai cair ao longo de um ciclo de treinos, se a capacidade de recrutar fibras musculares relativas à pedalada vai aumentar, se o volume de enzimas oxidativas e taxa de hematócrito vão elevar-se também, isso tudo e demais variáveis anátomo-fisiológicas passam a segundo, terceiro plano, pois elas só têm sentido com o aumento da potência.
Quando se sabe que está evoluindo e quais são os picos de potência para os intervalos mais importantes das principais competições, basta planejar os treinos pensando no tempo ideal estímulo-recuperação-supercompensação para ter um nível de resposta acima de treinamentos baseados em protocolos não referenciados pela potência. Afirmo isso porque há cinco anos venho treinando ciclistas que se preparam com e sem medidores de potência, e até esse momento constatei que a evolução dos primeiros é mais rápida e maior do que a dos outros. Portanto, da próxima vez que você pensar em investir em sua bicicleta, prefira um power meter à peças ou acessórios. A certeza de retorno em performance é muito maior e duradoura.
Principal referência para esse texto: Allen H. e Coggan A. – Training and Racing with a Power Meter, Velopress, 2006.
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